Alguns dias atrás eu estava me movimentando em casa, por falta do que fazer, tédio ou qualquer outra coisa. Aqueles momentos que todo praticante de parkour conhece bem. Essa idéia de pisar em um azulejo aqui e outro ali, pular ali e subir aqui, ir da cozinha à sala sem pisar em determinado lugar, etc. acabou gerando em minha mente essa frase que usei como título do post. Agora vou me explicar melhor.

Pare por um momento e pense num treino simples de parkour, aqueles sem lugares altos, buracos gigantes, prédios enormes e corrimões finos. Não é tão difícil imaginar isso, já que muitos dos treinos em várias cidades do Brasil acontecem sem essas ‘situações de alto risco’. Logo um degrau distante de um meio-fio, um corrimão de uma escada, um murinho pequeno e muitas vezes até uma linha diferente no chão já se torna um ‘obstáculo’.

O Parkour acaba se tornando uma alternativa diferente de movimentar-se em determinado ambiente. Muitas vezes o que aos olhos dos ‘leigos’ no assunto é insignificante, para um de nós, praticantes, trata-se de um local ideal para ‘perder’ (ganhar) horas de treino. Mas será que estamos realmente facilitando nosso percurso? Eu diria que não.

Nos nossos treinos, tentamos imaginar uma situação real, um possível momento, em um possível lugar, com um possível risco, um possível perigo e com esses possíveis treinamos horas, dias, meses e anos em um lugar. Justificando o titulo, o que fazemos na verdade é nada mais que dificultar o percurso.

É fácil subir pela escada, dar dois passos para chegar à um lugar ao invés de pular, mas nós não queremos o fácil, buscamos sempre o mais difícil. Quando um movimento é ‘conquistado’ pelo grupo de praticantes, alguém surge com uma nova idéia, fazer o movimento e um girinho, ou com um pé, ou uma mão, e a criatividade nunca acaba nessa arte de dificultar a movimentação.

Agora não pense que acho isso ruim, muito pelo contrário. É nesse ponto que queria chegar. O ser humano é um bicho muito complexo, precisa de dificuldades para evoluir, aprender e desenvolver qualquer atividade. Aquilo que é fácil e simples normalmente não trará nada de novo para você. O aprendizado vem da resolução de um problema.

Quando fazemos coisas que para muitos são inúteis ou idiotas, como por exemplo, pular de raiz em raiz de uma árvore sem pisar na grama, estamos criando um problema, “não pode pisar na grama” e buscando soluções “vamos pular de raiz em raiz”. E é isso que traz a evolução no Parkour. A dificuldade leva ao aprendizado e ao crescimento.

Talvez seja por isso que comparem parkour com brincadeira de criança. Crianças de 2 a 7/8 anos são as campeãs nos quesitos imaginação e criatividade. Segundo os autores desenvolvimentistas eles estão em uma fase chamada Fase de Movimentos Fundamentais, que irão desenvolver toda a base motora que será utilizada por toda a vida, seja numa corrida ou em qualquer esporte.

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Esse período de nossas vidas trata-se de uma fase de grande evolução no que diz respeito à movimentação. As crianças usam sua imaginação fantástica para criar problemas, e as dificuldades impostas por elas mesmas, graças à criatividade sem fim, irão proporcionar seu desenvolvimento motor.

Mesmo que a possível situação para qual treinamos várias horas, dias e anos nunca chegue, o que temos que ter em mente é que não há momento de perigo que pague a evolução que o parkour traz nos nossos treinos. Voltamos a ser crianças, a usar a criatividade, a inventar, a dificultar e o mais importante, a evoluir.

Hoje vejo o parkour como ‘Ir de um ponto A à um ponto B da maneira mais difícil possível’ ou ‘Ir de um ponto A à um ponto B evoluindo o máximo possível’. Acredito que o girinho, a queda com 1 pé ou qualquer dificuldade ‘inútil’ acrescentada a um movimento simples vai fazer toda a diferença no nosso desenvolvimento como traceurs. É isso, espero que tenham me entendido. Ah… só pra lembrar, dificultem. (:

“É importante criar dificuldades para os que têm talento. As facilidades nos limitam.” (Bernardinho)